sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: UMA PROPOSTA DE DIRETRIZES PEDAGÓGICA

Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte – Ano 1, Número 1, 2002
Mauro Betti e Luiz Roberto Zulian


Educação física é uma expressão que surge no século XVIII, em obras de filósofos preocupados com a
educação. A formação da criança e do jovem passa a ser concebida como uma educação integral – corpo,
mente e espírito –, como desenvolvimento pleno da personalidade. A educação física vem somar-se à
educação intelectual e à educação moral. Essa adjetivação da palavra educação demonstra uma visão ainda
fragmentada do homem. O atual currículo escolar obedece aos critérios de divisão do conhecimento que
impera na ciência moderna. A matemática, as ciências, as línguas, a geografia, etc. correspondem às áreas do
saber científico e erudito que se desenvolveram especializada e isoladamente, com base em um modelo d
ciência que também remonta há dois ou três séculos. A Educação Artística, a Educação Moral e Cívica e a
Educação Física não se enquadram nesses limites e ocupam hoje um lugar incômodo na Escola, o que leva
ao questionamento tanto delas próprias, como da educação escolarizada e suas finalidades.
Nesse contexto, é compreensível que a tradição educacional brasileira tenha situado, desde a década
de 1920, a Educação Física como uma atividade complementar e relativamente isolada nos currículos escolares, com objetivos no mais das vezes determinados de fora para dentro: treinamento pré-militar, eugenia,
nacionalismo, preparação de atletas, etc.
Essa concepção demonstra hoje sinais de seu esgotamento. Assistimos, nos últimos 15 anos, à ascensão
da cultura corporal e esportiva (que denominaremos, de maneira mais ampla, “cultura corporal de movimento”) como um dos fenômenos mais importantes nos meios de comunicação de massa e na economia.
O esporte, as ginásticas, a dança, as artes marciais, as práticas de aptidão física tornam-se, cada vez mais,
produtos de consumo (mesmo que apenas como imagens) e objetos de conhecimento e informação amplamente divulgado ao grande público. Jornais, revistas, videogames, rádio e televisão difundem idéias sobre
a cultura corporal de movimento. Há muitas produções dirigidas ao público adolescente. Crianças tomam
contato precocemente com práticas corporais e esportivas do mundo adulto. Informações sobre a relação
práticas corporais-saúde estão acessíveis em revistas femininas, jornais, noticiários e documentários de TV,
nem sempre com o rigor técnico-científico que seria desejável. Não obstante isso, o estilo de vida gerado
pelas novas condições socioeconômicas (urbanização descontrolada, consumismo, desemprego crescente,
informatização e automatização do trabalho, deterioração dos espaços públicos de lazer, violência, poluição)
leva um grande número de pessoas ao sedentarismo, à alimentação inadequada, ao estresse, etc. O crescente número de horas diante da televisão, especialmente por parte das crianças e adolescentes, diminui a
atividade motora, leva ao abandono da cultura de jogos infantis e favorece a substituição da experiência de
praticar esporte pela de assistir esporte.
Hoje, somos todos consumidores potenciais do esporte-espetáculo, como telespectadores ou torcedores em estádios e quadras. A proliferação de academias de ginástica e escolinhas de esportes atende às
camadas média e alta. Centros esportivos e de lazer públicos oferecem, embora de maneira ainda insatisfatória,
programas de práticas corporais à população em geral.
A cultura corporal de movimento tende a ser socialmente partilhada, quer como prática ativa ou simples informação. Tal valorização social das práticas corporais de movimento legitimou o aparecimento da
investigação científica e filosófica em torno do exercício, da atividade física, da motricidade, ou do homem em
movimento. Inicialmente restrito ao domínio da Fisiologia do Exercício, área da Medicina, esse campo de
pesquisa está presente hoje em muitas áreas científicas, como História, Psicologia e Sociologia, além da
Filosofia. A partir dos anos 1960, na Europa e Estados Unidos, em meados da década de 1980, no Brasil, a
Educação Física passa a constituir-se, nas universidades, como uma área acadêmica organizada em torno da
produção e sistematização desses conhecimentos.
Essa situação gera um questionamento da atual prática pedagógica da Educação Física escolar por parte
dos próprios alunos que, não vendo mais significado na disciplina, desinteressam-se e forçam situações de
dispensa. Contudo, valorizam muito as práticas corporais realizadas fora da escola. O fenômeno é mais
agudo no Ensino Médio (antigo 2o grau), no qual, desconsiderando as mudanças psicossociais por que
passam os adolescentes, a Educação Física preserva um modelo pedagógico concebido para o Ensino Fundamental (antigo 1o grau)

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